Abre Aspas


"
O poeta é um fingidor. Finge tão completamente, que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente." (Fernando Pessoa)

11 de setembro de 2010

Tramar

Passe por debaixo da escada
Vire a segunda porta a esquerda
Abra a gaveta da estante de madeira
E leia em voz alta
O papel dobrado em três

“Minha vida não é mais a mesma
Te conheci e reconheci
Que não vivo sem você
Quero sua presença constante
No meu acordar e dormir

Nas noites com dores de cabeça
Nos passeios de domingo
O seu existir me completa
E a cada dia estou mais certo disso

Casa comigo?”

Arquitetar

Podia mudar o quarto
Trocar a cama
Uma maior seria uma boa pedida

Duas pessoas
Precisam de mais espaço para dormir

Amanhã pensamos no escritório
Pode não ter tanta serventia
Com um novo integrante chegando
As responsabilidades crescem

Talvez as férias nos Andes
Fiquem para depois
Quando ele já puder andar sozinho

Mas nunca esquecerei
Do que há entre nós
Teremos sempre o jantar à luz de velas
E as rosas no jardim

Vamos aproveitar cada segundo
E jamais
Esquecer o quanto é bom viver

Vingar

Acha que é assim?
Espere que tem volta
As vezes que te ajudei

Eu te carreguei nos braços

E agora esfrega o lixo em mim
Sem compaixão
Consideração maldita
Engula essa porcaria
Saiu da sua boca

O tapa
Vai ser o começo do hematoma
Vou deixar uma herança
Que seus netos irão lembrar

Jogar na sua cara
A pedra cuspida
Atirada no meu peito

Cutucou a onça
E vai sentir o arranhão
A resposta
Pelo cachorro que se tornou

Chocar

Defecar
E experimentar
O excremento

Coma
A sobra dos porcos
Lavagem
O feio a mostra
De todos os ângulos

Veja
Sinta
Absorva esse pus social

Engula
O sangue da ferida

Mostre a bunda
Para a sua avó
Na orgia familiar dominical

Ande nu
Pelos corredores da escola
A obscenidade tradicional
Geograficamente localizada

Deixe a inconsciente vontade
De ser a carne
Visitar o andar de cima

Chupar

Para dentro
O gosto

Delícia

Permitir
Que meu paladar sinta
Doce, salgado
Amargo fim

Vontade
De engolir
Mas o prazer
Se dá aos poucos
Pelo derreter

Saborear
Cada milímetro

Salivar
Só assim posso alcançar...

Vou sugar tudo para mim

Complicar

A rotatividade desmedida de uma esfera presa a um suporte, que de maneira descritiva baseada nos conhecimentos adquiridos na formação endocultural de um ser não é ele capaz de atingir esse objetivo, possui a capacidade de proporcionar a agradabilidade da presença em locais de grande aglomeração, pode ser utilizada para outros fins não publicáveis em meios sociais e desconfortar e chocar outros pelo fato de achar exagerado tal medida. Em certas ocasiões, esta mesma invenção que busca melhorar a convivência entre os seus usuários pode trazer desconforto generalizado por sensações do seu uso inadequado ou incontido, sendo alvo de ações repreensivas que geram sentimentos de contenção por parte do atingido.